sexta-feira, 16 de março de 2012

Recomendações ao homem virtuoso.

Produzido em janeiro de 2012.

Não imploro por teu bem querer, porque podes nutri-lo a um estranho. Ambiciono sentir o teu olhar em minha pele, o teu desejo em minha carne. Tua permanente missão consiste em marcares em profundidade a minha memória e fazer-me arrepiar à primeira lembrança tua.
Desnecessário que me digas o quanto sou importante em tua vida e sobre o quanto mudastes após conhecer-me. Importantes também são tuas amigas, tua madrinha ou tua mãe. Quero ser mais do que admirável, porque eu sou a mulher a invadir os teus sonhos, inclusive aqueles em que sonhas com os olhos abertos e a respiração ofegante.
Não quero que me anuncies com a pompa das princesas ou a gravidade das rainhas. Meus protocolos são outros e mais ousados. Às damas da corte designes grandiosos obeliscos, elas ficarão felizes em serem elementos da tradição de um povo. A mim reserves a imortalidade do sangue e sentir-me-ei afortunada em fazer parte da tua história.
Se por um acaso procuras uma mulher tranqüila, com vieses de bom senso e paz no coração, esqueças-me. Sou aquela a inverter os pólos do teu mundo, a invadir-te em horas impróprias e a surrupiar-te o sono. Sou a ventania a impedir-te o plantio e a chuva a molhar-te durante a noite. Retirar-lhe-ei todo o teu conforto até que percebas a majestade dos menores atos.
Se ao meu lado planeias descanso, te enganas. Sou o teu maior estímulo ao movimento, ao trabalho e à construção de tudo o quanto possas. Nos momentos em que estiveres cansado, conterei meu instinto como quem aprisiona o mar em uma mão e tu despertarás revigorado, embora nem tenhas dormido. Ressalto que jamais dormirás por completo enquanto estiveres ao meu lado, porque em ti repousa a minha segurança e teu principal dever consiste em velar-me.
Contudo, ao adoeceres cuidarei do teu corpo e quando fores abatido pelo desânimo, incentivarei teus bons pensamentos. Sou tua perpétua musa, a barda guerreira que afasta de ti a melancolia e te provocas a prosseguir em teu caminho.
Não te tenho exigências, ainda que te pareças ao contrário. Os ultimatos tu farás e a ti cobrarás. Terás um terrível medo ao cogitares perder-me e mover-te-á eternamente em minha direção. Tudo o que me dissestes terá ido em vão se por um deslize, tuas ações estiverem em desalinho.
Entretanto, há uma vaga possibilidade para que te concedas uma segunda ocasião, segundo o meu humor e a medida do teu deslize. Sempre que eu me recolher do teu olhar e das tuas mãos, saberás do teu erro e farás todo o possível para ver-me sorrir-te.
Se por algum acaso não te possuir ou te recusar o possível direito a possuir-me, não me julgues nem te julgues. Não será por ausência do desejo ou do carinho. Segues tua peregrinação. Sabes que me encontrarás em toda parte onde enxergares uma lembrança divina.